sexta-feira, 13 de maio de 2011

Carta aberta a Roberto Setúbal

Prezado Roberto,
Eu juro que não queria lavar nossa roupa suja em público, mas não tem outro jeito. É que eu falo, falo... e você não me entende! Será que estou falando grego? Ou russo? Cá entre nós, Roberto, essa dificuldade de comunicação está desgastando a nossa relação!
Nos últimos dezesseis anos, sempre estive ao seu lado (e olha que nesses anos todos fui muito assediada por seus amigos da banca!). Nunca lhe traí. Deixei minhas economias com você, usei seus cartões, fiz seguro e previdência privada... E aceitei, de bom grado, os empréstimos que você me ofereceu (e paguei direitinho, com juros e tudo).
Durante um bom período, eu fui, inclusive, sua sócia (minoritária, naturalmente). Comprei ações quando elas estavam bem baratinhas e “sentei em cima”, esperando o preço subir. Sabia que era uma questão de tempo. Quando vendi os papéis, na alta (alguma coisa eu tinha que aprender cobrindo o mercado financeiro, não é mesmo?), embolsei um lucro razoável.
Sabe, Roberto, sempre apostei em você e em sua capacidade de fazer bons negócios. E foram tantos bons negócios realizados nos últimos anos, não é mesmo? Se não me falha a memória, dos anos 90 para cá você comprou mais de dez bancos. E hoje está no topo. Justo, justíssimo, como diria aquele personagem cujo nome não me recordo agora.
Preciso lhe contar uma coisa, Roberto: a cada conquista sua, a cada nova aquisição, eu me sentia mais importante... Provavelmente influenciada pela propaganda, beleza de propaganda criada pela África que faz a gente se sentir importante mesmo não sendo.  
Mas você me decepcionou, Roberto. Após me fazer acreditar que eu teria direito ao benefício do seguro bagagem ao comprar passagens aéreas com um de seus cartões, você vem e me diz que “não é bem assim, que eu entendi errado, que o benefício era só para determinado trecho da viagem”.
Então tá. Acho que embalada por “Imagine” eu sonhei que era cliente de um banco que se prepara para atender necessidades que eu ainda nem sei que terei!
Saudações cordiais,
Susi Aissa

BREVE RELATO DE MEU 'IMBRÓGLIO' COM O ITAÚ

Sempre que viajo ao exterior, compro minhas passagens com o cartão Personnalité Visa Platinum. Primeiro, porque tento concentrar nesse cartão a maior parte de minhas despesas (além dele, tenho o Mastercard Itaú e o Diners). Segundo, pelos benefícios concedidos em viagens (como a carta do Tratado de Schengen, que sempre solicito e, felizmente, nunca uso).

Não foi diferente em minha última viagem à Europa, realizada no final de 2010/início de 2011. Em setembro de 2010, comprei com esse cartão duas passagens de “viagem redonda (ida-e-volta)” para a Europa, para mim e minha filha, adquiridas junto à Alitalia/KLM, sendo a viagem de ida via Roma (São Paulo/Roma) e a de volta via Amsterdam (Amsterdam/São Paulo).

A viagem teve duração de 27 dias no total: embarcamos em São Paulo rumo à Roma no dia 20/12/2010 e retornamos no dia 15/01/2011, procedentes de Amsterdam. Os trechos internos da viagem (da Itália à Holanda, passando por Suíça e França) foram feitos por trem, cujas passagens foram compradas com outro cartão Itaú (Itaucard Mastercard Internacional).

No último trecho interno da viagem, durante percurso de trem entre Paris e Amsterdam em 11/01/2011, tive uma bagagem furtada e INFELIZMENTE decidi acionar o seguro bagagem (disponibilizado para quem compra as passagens aéreas ida e volta com o cartão Visa, conforme previsto nas “Condições Gerais do Seguro Bagagem”).

Passados quatro meses do ocorrido (e depois de muitas idas e vindas e da apresentação de vários documentos, entre eles o boletim de ocorrência), fui informada nesta semana pelo Serviço de Atendimento ao Cliente Itaú e pela Ouvidoria do banco, a quem recorri, que meu pedido de indenização havia sido recusado pela Itaú Seguros, com a alegação de que o sinistro ocorreu em trecho da viagem não coberto (!!!) pelo seguro. Ou seja, eu só teria direito ao benefício se a mala tivesse sido furtada em Roma ou Amsterdam. O resto da viagem não conta!

Como cliente do Banco Itaú (há décadas) e da própria Itaú Seguros (há anos), além de portadora de dois cartões do banco, estou indignada. 

Se eu comprei as passagens aéreas (ida e volta) com o cartão – fazendo jus, portanto, ao benefício do seguro bagagem –; II) se o sinistro ocorreu dentro do prazo e abrangência de cobertura da viagem; e III) se eu anexei ao processo o boletim de ocorrência que comprova o furto, bem como toda a documentação referente à compra dos bilhetes, por que tive meu pedido de indenização recusado?

Por que o Itaú faz o cliente acreditar que ele tem um benefício para depois, quando o benefício é cobrado, afirmar “não é bem assim, a senhora entendeu errado...”?

Quisera eu ter entendido errado. Assim, não teria perdido tempo fazendo boletim de ocorrência num posto policial em Amsterdam (o que me custou algumas horas naquela bela cidade), providenciando documentos, enviando cartas à seguradora... Quisera eu, principalmente, que o sinistro não tivesse ocorrido; assim, jamais teria acionado a Itaú Seguros!

A respeito da última correspondência da Itaú Seguros (de 25/04/2011), na qual a seguradora “justifica’ a recusa da indenização de seguro bagagem pleiteada, gostaria de ressaltar que:

1)      O pedido de indenização foi formulado com base nas “Condições Gerais do Seguro Bagagem” do cartão Personnalité Visa Platinum, usado na compra de duas passagens aéreas (ida e volta), que prevê o seguinte:

“Ao adquirir passagem em transporte público autorizado (aérea, marítima ou terrestre) ou pacotes turísticos com seu cartão, você conta com a cobertura do seguro contra perda, roubo ou extravio de bagagens, em viagem nacional ou internacional com duração máxima de 30 dias e destino com distância superior a 100 km da residência permanente. (...) Cobertura: na compra de passagem ‘viagem redonda (ida e volta), terá cobertura do momento que sair de sua residência, até o seu regresso em sua residência”.

2)      Como ficou claro, o furto da bagagem ocorreu dentro do período de cobertura da viagem (“duração máxima de 30 dias” e “cobertura do momento que sair de sua residência até o seu regresso em sua residência”).

3)      O fato de a passagem terrestre (trem) no trecho Paris/Amsterdam, onde ocorreu o sinistro, ter sido adquirida com outro cartão (Itaucard Mastercard Internacional) não anula o benefício adquirido por ocasião da compra das passagens aéreas com o cartão Personnalité Visa Platinum. Foram as passagens aéreas (ida e volta) adquiridas com esse cartão que nos permitiram ir e voltar da Europa.

4)      Se mencionei a compra das passagens de trem com outro cartão (Itaucard Mastercard Internacional) foi com o objetivo de reforçar o grau de fidelização em minha relação comercial com o Itaú. Em nenhum momento pretendi assegurar que o pagamento da indenização fosse baseado na utilização desse cartão (até porque sei que ele não prevê o benefício do seguro bagagem).

5)      Diante de tudo o que foi exaustivamente relatado, fica a pergunta: o que a Itaú Seguros entende por “cobertura do momento que sair de sua residência até o seu regresso em sua residência” (“Condições Gerais do Seguro Bagagem” do cartão Visa)? Será que o trecho entre Paris e Amsterdam, onde ocorreu o sinistro, não fazia parte da viagem?

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Pôr-do-Sol no Pacífico

Saudades de Valparaiso...

sábado, 17 de outubro de 2009

Referências etílicas (ou como sobrevivi a 16 daiquiris!)


O "El Floridita", em Havana, é um desses bares que nos cativam tanto que é quase impossível sair de lá... inteiro! Após uma longa caminhada por "La Habana Vieja", entrei no "El Floridita" por volta das 11 horas da manhã, louca para experimentar seu famoso (e delicioso) daiquiri. Sentei-me no balcão, ao lado da estátua de Hemingway. E pedi um daiquiri, depois outro, e mais outro... sempre brindando com Hemingway. Quando me sentei para almoçar, no próprio restaurante do "El Floridita", por volta das 4 horas, já tinha tomado 16 daiquiris! Concluí que já havia bebido daiquiri demais e pedi uma meia garrafa de vinho para acompanhar o almoço.




Saí de lá "trançando" as pernas", mas, felizmente, já havia um táxi a minha espera, na porta do bar. Fui direto para o hotel e dormi até as 10 da noite. Acordei faminta, sem nenhuma ressaca, e passei o resto da noite (e da madrugada) tomando mojito em um dos bares do Hotel Nacional (ao lado), em companhia de uma chilena e de um mexicano que também estavam hospedados lá.

Memórias cubanas

Como já mencionei em outro 'post', minhas viagens sempre seguem um roteiro histórico-etílico-religioso, não necessariamente nessa ordem. Cuba, onde estive há quinze anos, foi uma exceção. Não visitei igrejas ou quaisquer outros templos religiosos. Em compensação, conheci escolas e hospitais, levada por meus amiguinhos cubanos: três estudantes, com idade entre 10 e 12 anos, que se ofereceram para me "guiar" pelas ruas de Havana em troca de sorvete e outras guloseimas (e da "antecipação" dos capítulos da novela brasileira então exibida em Cuba... rs). Por que escolas e hospitais? Porque ali, segundo eles, estava o verdadeiro sentido da Revolução: educação e saúde de qualidade para todos!

Eu não poderia ter escolhido "guias" melhores. Nos três ou quatro dias que estivemos juntos, sempre no período da tarde, após as aulas, aprendi muito com aqueles meninos... Em certa ocasião, enquanto caminhávamos por Havana, senti sede, e os convidei para um refresco no bar de um hotel próximo de onde nos encontrávamos. Quando estava fazendo o pedido para o garçom (uma cerveja para mim e um refrigerante para cada um deles), o mais velho dos meninos me interrompeu e disse que um único refrigerante bastaria para os três, aparentemente preocupado com o "gasto excessivo" que eu teria. "Estamos acostumados a dividir", afirmou o garoto, ao que respondi: "Entendo, mas hoje não é necessário dividir". E fiz sinal ao garçom para que trouxesse os três refrigerantes. Quando estava indo embora, o garçom comentou que, no sábado seguinte (era uma quinta-feira), haveria uma festa para as crianças na piscina daquele hotel e que, se eu quisesse, poderia levar os meninos, mediante o pagamento de uma taxa, equivalente ao valor de um lanche. Os olhos dos meus jovens amigos brilharam; eles nunca haviam nadado em uma piscina! Combinamos que, se os pais deles permitissem,    eu os levaria à festa.

No dia seguinte, um deles telefonou para avisar que poderiam ir e que me encontrariam no sábado de manhã, na porta do meu hotel. No sábado, no horário combinado, lá estavam os três, à minha espera. Em suas sacolas de pano, carregavam calções de banho e toalhas. Fomos para o hotel da festa e, durante três ou quatro horas, eles se esbaldaram na piscina. De tempos em tempos vinham até minha mesa dizer que estavam muito felizes e para agradecer pela diversão. Quando o garçom trouxe o lanche (que fazia parte do "pacote" da festa), presenciei uma das cenas mais comoventes de minha vida. Um dos meninos pegou metade de seu lanche (um misto frio de presunto e queijo) e embrulhou num guardanapo. "Você não está com fome"?, perguntei. "Sim, estou. Mas vou levar esse pedaço para meu irmão, ele nunca comeu pão com presunto!" Tive vontade de chorar, mas me contive. E entendi naquele momento por que dias antes, ao passear pelo Malecón, meus jovens guias me fizeram mudar de calçada quando nos aproximamos da Embaixada dos Estados Unidos. Eles perdoavam tudo, menos o maldito embargo econômico! Por onde andarão aqueles meninos?

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

De pijama no Café de Flore




Ah, o Café de Flore... Perdoe-me, Tetê, mas eu vou ter que contar o que se passou naquela noite gelada do inverno parisiense... (rs) Após um dia exaustivo na Eurodisney, eu e minha filha fomos para o hotel onde estávamos hospedadas, na rue St. Benoit, ao lado (literalmente) do Café de Flore. Ela tomou um banho quente, colocou o pijama e fez um lanche reforçado ali no quarto mesmo. Dei uma aspirina, para ajudar a relaxar, e a coloquei na cama. “Agora você fica aí, quietinha, e tenta dormir. A mamãe vai ao Café de Flore tomar um vinho e volta logo.” Assim que ela adormeceu, tranquei a porta do quarto e saí.
Como o salão principal do Café de Flore estava um tanto barulhento naquela noite, sentei-me em uma mesinha na área externa, devidamente protegida do frio por amplas janelas de vidro, de onde podia observar o movimento tanto da Rue St. Benoit quanto da Boulevard Saint-Germain. Pedi uma taça de bordeaux, acendi um cigarro e fiquei ali, observando a neve que caía e “conversando” com os fantasmas de Sartre e Simone de Beauvoir. Uma hora e meia depois, quando já me preparava para sorver a terceira taça de vinho, ouço alguém batendo na janela de vidro. Olho para o lado, e quase não acredito no que vejo. Era ela, minha filha (então com 10 anos), de pijama, gorro e, naturalmente, tremendo de frio! Uma perfeita “homeless”... (rs)

Fiz sinal para que ela entrasse no café e viesse até minha mesa, sob o olhar estupefato do sisudo garçom e dos demais clientes. O que ela fez, aliás, sem nenhum constrangimento, com a naturalidade típica das crianças, a quem, aparentemente, tudo é perdoado – inclusive entrar de pijama no elegante Café de Flore. “Mamãe, eu sonhei com o trem fantasma do parque e acordei assustada”, disse-me ela, enquanto nos abraçávamos. “Está tudo bem, querida, mas nunca mais saia num frio desses sem casaco, OK? Você pode pegar um resfriado”. Ela se sentou ao meu lado e  pediu, em francês, um chocolate quente ao garçom. Logo depois eu pedi a conta e voltamos para o hotel., abraçadinhas Até hoje, passados quase cinco anos desse episódio, damos boas risadas ao lembrar do ocorrido!

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Referências gastronômicas


Cebulowa z Grzyb, a tradicional (e deliciosa) sopa de cebola polonesa.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Saúde do santo ou moral do demônio?



Artigo da psicanalista Patricia Porchat*, publicado na edição de outubro da revista Mente & Cérebro. Excelente!

Em resposta a alguém que lhe perguntou em certa ocasião qual era o significado simbólico de um charuto, Sigmund Freud respondeu que, às vezes, um charuto é apenas um charuto. Mas podemos acrescentar que, justamente por ser um charuto apenas “às vezes”, há situações em que representa algo distinto. Na mitologia do próprio charuto ele já foi, por exemplo, símbolo do poder, o que, em termos psicanalíticos, pode ser chamado de “símbolo fálico”. Transportando essa questão para os dias de hoje, o que representa o cigarro na recente discussão acerca de sua proibição em locais públicos?

Em agosto entrou em vigor a lei antifumo em São Paulo com a promessa de ser igualmente implantada em outros estados. O argumento principal dos criadores da legislação é que muitos fumantes passivos – aqueles que sofrem os efeitos do fumo por exposição à fumaça do cigarro dos fumantes ativos – desenvolvem câncer de pulmão. Está comprovado o fato de haver um elevado número de mortes por esse motivo.

Uma primeira representação para o cigarro – aquele que mata – pode ser a de uma arma. Podemos usar nossa imaginação e dizer que, antes da lei antifumo, o fumante (ativo) seria, no máximo, acusado de homicídio culposo. Tratava-se de um delito provocado pela falta de cuidado objetivo do agente, imprudência, imperícia ou negligência. No entanto, não há a intenção de matar. Mas agora a coisa mudou.

Com a proibição de fumar para não espalhar sua fumaça-veneno (também podemos atribuir símbolos à fumaça), o cigarro-arma se tornaria a prova de um crime pior: o homicídio doloso. Este consiste na vontade livre e consciente de assassinar alguém. Por isso, a implementação da lei antifumo se faz acompanhar de um sistema de denúncias. O fumante-assassino deve imediatamente ser interceptado para não causar danos a outrem. Mas o cigarro também representa o prazer. O próprio ato de fumar é prazeroso, dizem os fumantes. Acalma a ansiedade para alguns, é estimulante para outros. Também existe o cigarro depois da comida, do café e do sexo, que atua como complemento. Revela um prazer que se prolonga. Reafirma a satisfação obtida, pois tem valor de uma confirmação: “...sim, foi bom para mim”. Para muitos fumantes, acender um cigarro é um ritual em que corpo e espírito se encontram: prazer do corpo e simbolização desse prazer (no espírito) por meio do rito.

Curiosamente, a lei antifumo permite o cigarro em cultos religiosos, mesmo em ambientes fechados, desde que isso faça parte do ritual. Há que perguntar aos praticantes do culto o que o cigarro ou o charuto simbolizam naquele contexto. Afinal, por que seria mais legítimo do que o ritual particular de cada um na vida cotidiana?

Outra curiosidade é a permissão para fumar nas áreas a céu aberto nos estádios de futebol. O cigarro tem aí um poderoso efeito de acalmar a ira e a expectativa dos torcedores. É o “sossega-leão”: funciona como calmante. Mas, se o time querido marcar um gol... também se pode acender um cigarro-prazer e reafirmar a alegria do momento.

Nos ambientes de trabalho, mesmo que existam áreas abertas e jardins, não se pode fumar. Dizem que a fumaça se espalha e atinge os fumantes passivos. Talvez se espalhe de modo diferente, do modo como se propaga no estádio de futebol. A catarse coletiva justificaria o prazer. O trabalho, não. O cigarro-prazer, se fumado no ambiente de trabalho, enfrentaria a lei que parece dar um recado: a nossa sociedade exige produtividade. Onde há trabalho, não deve haver descanso. Mas existe – ou melhor, existia – também o cigarro-escape. Se o cigarro-charuto representa o poder,proibi-lo é uma forma de impedir a recuperação da autoestima. Sentir tensão, pressão ou sofrer humilhação (situações comuns em ambiente de trabalho) exige um recuo emocional, uma espécie de rearmamento. O cigarro-escape era também um cigarro-enfrentamento.
Cabe à União editar normas “gerais” sobre temas ligados à saúde. Estados e municípios editam normas complementares. Independentemente da questão que se coloca sobre a autonomia dos estados e municípios para estabelecer regras mais duras do que aquelas que foram ditadas pela União, devemos atentar para o fato de que alguém legisla sobre nossos corpos e nossos hábitos. “Biopoder” é o termo criado pelo filósofo e historiador francês Michel Foucault (1926-1984), na década de 70, para referir-se à prática dos Estados modernos de desenvolver um número sem igual de técnicas destinadas à subjugação dos corpos e ao controle das populações.

A transformação radical dos comportamentos por meio da abrupta imposição de novas regras não deveria ser exigida sem uma discussão prévia acerca do significado individual e coletivo desses mesmos comportamentos. O que significa o cigarro? O que significa fumar? Não se pode impunemente elencar comportamentos aceitáveis ou inaceitáveis a partir de uma moral do bem e do mal estabelecida com base no que se considera saudável, ou não, exclusivamente do ponto de vista biológico.

O problema que se coloca não é apenas o da luta pela saúde, mas o da maneira pela qual se exerce o poder. Como e em nome do que esse poder é exercido? Fazer proibições em nome da saúde de absolutamente todos é um equívoco denunciado por Foucault. É uma forma extremamente sutil e, por que não dizer, perversa, de instalar o poder. Autoridades da lei antifumo têm dito que o fumante não foi impedido de exercer sua liberdade individual, pois, afinal, ele pode beber, comer, dançar e depois, prazerosamente, fumar... dentro de sua própria casa. Um presidiário pode fazer o mesmo em sua cela. Diríamos que ele está exercendo a sua liberdade individual?

Consideremos a necessidade de evitar que os fumantes passivos desenvolvam sérios problemas pulmonares e venham a falecer. É legítimo buscar a saúde dessas pessoas e intervir de modo a atingir esse objetivo. É igualmente legítimo possibilitar que eles circulem por áreas amplas e não sejam constrangidos a conviver com fumantes. Mas a recíproca é verdadeira. Poderia haver bares, restaurantes, cafés, boates e jardins para um grupo e para outro. Se os “não fumantes” são maioria, que existam mais estabelecimentos e áreas próprias a eles. Caberia aos donos desses lugares optarem por sua clientela. Caberia ao governo criar incentivos para que alguns estabelecimentos garantissem exclusividade para “não fumantes”.

A saúde da moral ficaria assim garantida em vez de querer fazer prevalecer a moral da saúde, em que saudável seria igual a “bom” e “não saudável” equivaleria a “mau”. O risco de a medicina tomar o lugar da Igreja Católica em relação aos preceitos morais foi denunciado há muito tempo. Isso não significa que a própria medicina e mesmo a população tenham se dado conta disso. É fundamental entender que a saúde não compreende apenas o organismo, mas que necessariamente leva em conta a mente que representa, simboliza e dá significado aos fatos do corpo. Essa, sim, é uma percepção saudável de si mesmo e da vida em sociedade. Em tempo: não sou fumante.

(*) Patricia Porchat é psicanalista, doutora em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo (USP) e professora da Universidade Paulista (Unip)


quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Eternas referências – Pushkin



“O homem que outrora fui, o mesmo ainda serei:
leviano, ardente. Em vão, amigos meus, eu sei,
de mim se espere que eu possa contemplar o belo
sem um tremor secreto, um ansioso anelo.
O amor não me traiu ou torturou bastante ?
Nas citereias redes qual falcão aflante
não me debati já, tantas vezes cativo?
Relapso, porém, a tudo sobrevivo,
e à nova estátua trago a antiga oferenda...”
Alexander Pushkin



“A palavra de um poeta é a essência do seu ser”
“Nunca encontrareis a poesia se não a tiverdes dentro de vós”
“Amar? Para quê? Por um tempo, não vale a pena. E, para sempre, é impossível”




Acima, “estátua” de Pushkin no “Café Literário”, em São Petersburgo. Ao lado e abaixo, fotos da fachada e dos jardins do prédio em São Petersburgo onde Alexander Pushkin morou nos dois últimos anos de sua vida, transformado em museu. No interior do apartamento do grande poeta russo, emocionei-me com seus manuscritos e objetos pessoais – principalmente com a arma usada por Pushkin no duelo que lhe tirou a vida, aos 37 anos de idade, e com a camisa manchada de sangue! Fui às lágrimas. Literalmente.



“Perder a razão é uma coisa terrível. Antes morrer. A um morto consideramos com respeito, rezamos por ele. A morte fá-lo igual a todos. Enquanto um homem privado da sua razão deixou de ser homem.”


Eugene Onegin”, obra-prima de Pushkin, foi transformada em ópera por  Tchaikovsky (ao lado, túmulo do compositor russo no Monastério Alexander Nevsky)

Pushkin nasceu em 06/06/1799 em Moscou e morreu em 10/02/1837 em São Petersburgo.
 



domingo, 27 de setembro de 2009

Cigarros são sublimes!


Bogart e Bacall

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Sobre o exercício da tolerância



Reproduzo aqui, com destaque, trecho do último comentário de meu amigo P. R. Baptista, não fumante convicto:

“(...) Infelizmente (para os fumantes) os não fumantes, antes passivos, se organizaram e junto com outros ‘minorias’ (mulheres, gays, negros, indígenas, etc.) passaram a cobrar seu espaço, que passa inevitavelmente pela supressão do espaço do fumante. Trata-se de uma tendência que não vejo, neste momento, como se reverter.”

Parafraseando Voltaire, “não estou de acordo com aquilo que dizeis, mas lutarei até o fim para que vos seja possível dizê-lo”.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Eternas referências – Dostoiévski




"A beleza salvará o mundo” (Fiodor Dostoiévski, in “Discurso sobre Pushkin”)



Ao lado, retrato de Dostoiévski pintado por Vasily Perov (acervo da Galeria Tetriakov, em Moscou). Abaixo, entrada do Museu Memorial Dostoiévski, em São Petersburgo, no prédio onde o escritor morou  nos três últimos anos de sua vida.





Abaixo, gabinete de trabalho de Dostoiévski em seu último apartamento de  São Petersburgo, onde ele escreveu Os Irmãos Karamazovi”. Na parede, à esquerda, uma fotografia da “Madonna”, de Rafael, pintura favorita de Dostoiévski. 






O relógio sobre a mesinha no escritório do escritor “parou” no dia e hora em que Dostoiévski morreu: 8h36 da manhã de 28/01/1881. 










Abaixo, fotos de objetos pessoais e interior do apartamento do escritor.





"Nenhum homem e nenhuma nação podem existir sem uma idéia sublime. E no mundo existe uma única idéia sublime – nomeadamente, a idéia da imortalidade da alma do homem –, pois todas as outras idéias ‘sublimes’ de vida, que dão vida ao homem, são meras derivações desta única idéia.” ("Diário de um Escritor")



“Os criadores e os gênios, no início da sua carreira, quase sempre, e muitas vezes até no fim, sempre foram considerados pela sociedade como uns parvos e uns loucos — é esta uma das observações mais triviais e sabidas” ("O Idiota")




"Realmente, se um dia de fato se descobrisse uma fórmula para todos os nossos desejos e caprichos – isto é, uma explicação do que é que eles dependem, por que leis se regem, como se desenvolvem, a que é que eles ambicionam num caso e noutro e por aí fora, isto é uma fórmula matemática exata – então, muito provavelmente, o homem deixaria imediatamente de sentir desejo. Pois quem aceitaria escolher por regras? Além disso, o ser humano seria imediatamente transformado numa peça de um órgão ou algo do gênero; o que é um homem sem desejos, sem liberdade de desejo e de escolha, senão uma peça num órgão?” ("Memórias do Subsolo")









“Os tempos atuais são tempos de ‘aurea mediocritas’ e de indiferença, de paixão pela ignorância, de preguiça, de incapacidade para o trabalho prático e da necessidade de receber tudo já pronto. Ninguém raciocina, será raro alguém elaborar uma idéia pessoal. (...) Desapareceu por completo uma idéia cimentadora. É como se toda a gente vivesse numa estalagem, preparando-se para fugir amanhã da Rússia. Todos vivem apenas para a sua abastança...” ("O Adolescente")






“Se Deus não existe, tudo é permitido” ("Os Irmãos Karamazovi") 





Ao lado, o túmulo de Dostoiévski no “Alexander Nevsky Monastery”, em São Petersburgo.





Fiódor Dostoiévski nasceu em 11/11/1821, em Moscou, e morreu em 28/01/1821, em São Petersburgo.



Eternas referências



Não viajo (apenas) para conhecer novos lugares. 

Viajo, principalmente, para conhecer lugares onde nasceram, viveram ou morreram - e estão enterrados - pessoas que 'marcaram' a minha vida. Pessoas cujas vida e obra me emocionam e me inspiram... Non, definitivamente minhas viagens não são simples viagens. Ao contrário: são 'viagens' ao encontro de minhas grandes paixões: a Literatura e a Música! 

Em minha última viagem, conheci as cidades onde nasceram, viveram ou morreram os genais Dostoiévski, Tolstói e Pushkin (Moscou e São Petersburgo), Kafka (Praga), Beethoven (Viena), Mozart (Salzburg) e Thomas Mann (Munique). E revisitei a cidade onde moraram Goethe, Schiller, Bach e Mendelssohn (Leipzig).