sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Acordado


Sempre fiz questão de nunca fumar quando estou a dormir” (Mark Twain)

Sobre chuvas, lixo e descaso


Meu cigarro é testemunha de que eu não pretendia falar sobre política aqui neste espaço, mas é inevitável. Diria que é mais forte do que eu... Mas asseguro que tem a ver com a “fumaça” (rs).

Pois bem. O que se viu em São Paulo nesta semana – principalmente na última terça-feira, quando a cidade praticamente parou em decorrências das fortes chuvas – não foi apenas uma resposta da natureza a um modelo (modelo?) urbanístico equivocado que, para viabilizar um sistema viário igualmente equivocado (que prioriza o automóvel, em detrimento do transporte público), contribui para a crescente impermeabilização do solo. Foi isso também, é claro. Mas não só.

O que se viu nesta semana em São Paulo foi obra, principalmente, do descaso do poder público – o que, em se tratando de uma prefeitura administrada por Gilberto Kassab, não surpreende.

Para fazer “caixa” (sabe-se lá com que propósito), a prefeitura contingenciou os recursos destinados às obras contra enchentes, como revelam os dados da execução orçamentária do município (dos R$ 18,5 milhões previstos no Orçamento de 2009 para a construção de novos piscinões e reservatórios de águas das chuvas, o prefeito Gilberto Kassab, do DEM, congelou R$ 17,1 milhões, empenhando até agora apenas R$ 1,3 milhão – ou 7,3% da verba prevista).

Como se isso não bastasse, há cerca de dois meses Kassab reduziu em 20% os recursos destinados à varrição e coleta, o que resultou em um aumento significativo de lixo nas ruas da capital.

O resultado desse descaso pôde ser conferido na última terça-feira. Com as ruas e rios entupidos por toneladas de lixo, a água das chuvas – sem ter para onde escoar – provocou dezenas de pontos de alagamento.

É evidente que, ao jogar lixo nas ruas, a população contribui para o problema das enchentes. Mas, falta de educação e civilidade à parte, há que se considerar o fato de que, muitas vezes, joga-se lixo nas ruas porque não há lixeiras e caçambas suficientes para o depósito de resíduos. Suficiente, aliás, é modo de dizer, porque, em muitas regiões da cidade, simplesmente não existem lixeiras. E, quando existem, ora estão depredadas, ora estão transbordando de lixo – sem que ninguém se digne a recolhê-lo.

Detalhe: não estou falando da periferia (onde, certamente, a situação é muito pior), mas sim de bairros da região central, muitos deles considerados “nobres”, como os Jardins. Do centro velho, onde está sediada a Prefeitura; da Avenida Paulista, um dos cartões postais de São Paulo... Não faz muito tempo, foram colocadas lixeiras de concreto ao longo da avenida, mas o lixo nem sempre é recolhido. Muitas vezes – como já presenciei em pontos diversos da Paulista –, o funcionário da limpeza substitui o saco plástico das lixeiras, mas não remove o lixo da avenida: o saco repleto de resíduos permanece ali, próximo da guia, por várias horas, até ser recolhido pelo caminhão. Quando vejo isso, torço para não chover, porque, se chover, o estrago é inevitável: o saco se abre, entupindo os bueiros de lixo!

Como eu me recuso a jogar lixo nas ruas, coloco meus resíduos – como lenços de papel usados e embalagens em geral – na bolsa e, se não encontro uma lixeira, levo tudo para casa. Mas o que fazer com a quimba do cigarro? Sim, porque em São Paulo, inacreditavelmente, não há cinzeiros públicos (como os observados nas ruas de cidades européias, como Varsóvia, na foto acima).

Quando encontro uma lixeira na rua, eu apago o cigarro no chão e jogo a quimba lá dentro. E quando não encontro (no meu bairro, por exemplo, não há lixeiras nas ruas), jogo onde? Na rua? Mas isso vai contra os meus princípios. Ademais, o mesmo Kassab que reduziu os recursos para os serviços de varrição e coleta de lixo estipulou uma multa de R$ 500 para quem for surpreendido jogando quimba de cigarro nas ruas! Isso numa cidade onde 1) não existem cinzeiros; 2) o número de lixeiras é desproporcional ao tamanho da metrópole; e 3) só é permitido fumar em casa ou ao ar livre...

Se nos é permitido (por enquanto) fumar apenas em casa e nas ruas, o mínimo que podemos exigir é que sejam instalados cinzeiros públicos em toda cidade. Caso contrário, seremos responsabilizados também pelas enchentes de São Paulo.